“Estévia” é um poema em homenagem à resistência da rede Solidariedade de Mulheres Haitianas [Solidarite Fanm Ayisyèn – SOFA] contra a desapropriação de suas terras destinadas à agricultura orgânica e à educação popular. O poema se inspirou em um material produzido pelo Capire. O território onde funciona a Escola Agrícola de Agricultura Orgânica “Délicia Jean” foi reivindicado por Andy Apaid Jr., um magnata haitiano conhecido por liderar a coalizão que, em 2004, encabeçou um golpe de estado em colaboração com os Estados Unidos. A ação de ocupação do território organizada por Apaid foi brutal com as militantes da SOFA e destruiu as cercas erguidas pelas participantes do projeto, que demarcavam um território de igualdade e de produção sem veneno e exploração. O objetivo da usurpação dessas terras é produzir estévia para fazer adoçantes para uso da Coca-Cola.
“Estévia” é um poema inédito de Helena Zelic, militante da Marcha Mundial das Mulheres do Brasil, comunicadora e poeta, autora de livros como A libertação de Laura (2021) e Durante um terremoto (2018).
ESTÉVIA
nunca entrei em uma fábrica da coca-cola
pela porta da frente nem pela de trás
nunca vi passar a corrente
de água nos tubos industriais
o brilho das bolhas, alguma fumaça
quantas pessoas são necessárias
para produzir uma garrafa
enchê-la transportá-la?
uma para esvaziá-la
nunca entrei em uma fábrica da coca-cola
não sabemos onde ela está
do que mais ela é capaz
sempre estive e estou no brasil
nunca pisei os pés no haiti
onde há mulheres expulsas da terra
porque é preciso exportar estevia
para as fábricas da coca-cola
em algum nó cego, bruto
dentro do sul do mundo