“Mulher, nada é normal”, diz um dos versos do poema “Mulheres”, da feminista chilena Mafalda Galdames. O poema abre um diálogo com as mulheres sobre o tempo, a esperança e a utopia, e integra o livro Hoy es el tiempo [Hoje é o tempo], publicado em 2016 em espanhol pela editora Forja. Mafalda é poeta, professora, mestra em Estudos Sociais e Políticos Latino-americanos, integrante da Sociedade de Escritores do Chile (SECH), e uma das fundadoras da Marcha Mundial das Mulheres no Chile e da Associação Nacional de Mulheres Rurais e Indígenas (Anamuri).
Antes de Hoy es el tiempo, Mafalda publicou os livros Mujeres bonitas [Mulheres bonitas], também em 2016, dedicado às mulheres invisibilizadas, e 20 poemas no desterro [20 poemas en el destierro], publicado em 1984, no México, para onde foi exilada durante a ditadura militar.
Mafalda se apropria das revelações de sua memória e, a partir da infância em seu bairro desordenado, reflete sobre sua vida, de mãos dadas com a vida das mulheres. Não nasci da sua costela, ela se rebela. Eu sou a mulher malcriada, aquela que vocifera, aquela que protesta contra a opressão ao povo palestino, às e aos estudantes que desafiam a ordem estabelecida, às companheiras curdas em defesa de seu território; aquela que combate a violência contra as mulheres, que reage à perda da nossa querida Berta Cáceres e a tantas injustiças.
Johanna Molina
São poemas feitos de vida. E a vida está em suas palavras, assim como em seu compromisso com ela, todos os dias.
Ximena Valdés
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Mulheres
Mulher, sobre seu mar se assoma a aurora
e seu sangue de lava subterrânea
se achega à semente e nos alcança.
Mulher, te chamarão
porque você sabe velar pela esperança
já sabe ser caminho e rebuliço,
a mãe que contempla a nova raça.
Mulher, nada é normal:
a alma quer cantar sobre a geada
apesar do nosso pão amargo
nossos irmãos feridos e desesperanças.
Mulher, quero te falar
das jornadas do sol em suas costas
de sua voz tecida pelo ar
de seu horizonte eterno, seus ensinamentos.
Mulheres, nos chamarão
em um espaço de amor de mil gargantas
e no final de tanta poesia,
dirão que a humanidade em nós descansa.
E talvez sejam nossas horas mais comuns as que nos faltam
e pode ser que contigo aconteçam os sonhos
desta jornada.