“Eu sou o Saara”, poema de Salka Embarek

17/02/2022 |

Por Capire

Pela liberdade do povo do Saara Ocidental, compartilhamos um poema de Salka Embarek

Facultad de Periodismo de la Universidad de La Laguna (ULL)

No dia 18 de fevereiro, os movimentos em luta pela autodeterminação dos povos de todo o mundo se mobilizam: é o Dia da Mulher Saarauí. O povo saarauí enfrenta o colonialismo do Estado marroquino, que se expressa com violência, controle territorial e econômico e perseguição política. As mulheres exercem um papel fundamental na resistência popular e nos processos de luta por autodeterminação: estão na linha de frente da organização e garantem a sustentabilidade da vida nas comunidades. Por isso, publicamos traduções do poema “Eu sou o Saara”, da poeta hispano-saarauí Salka Embarek.

Nascida em El Aiune, no Saara Ocidental, Salka migrou com sua família para as Ilhas Canárias. Em sua obra poética, são recorrentes os temas do retorno e da libertação de seu território. E não escreve sozinha: Salka faz parte da Geração de Amizade Saarauí [Generación de la Amistad Saharaui], um grupo de poetas pela libertação de seu povo. Com seus versos, Salka cria imagens que expõem, por um lado, o autoritarismo marroquino, e, por outro, a força da resistência anticolonial. Para ela, “a poesia é voz para a resistência, impulso para a denúncia, arma para a paz”. Salka compartilhou com Capire como foi o processo de escrita do poema:

“Eu escrevi o poema ‘Eu sou o Saara’ em outubro de 2009, após algumas declarações do porta-voz do regime marroquino desqualificando a Frente Polisário e depreciando o povo saarauí. Ele nos chamou de “fanfarrões”, debochou publicamente da nossa decisão e capacidade de pegar em armas novamente contra a violação sistemática dos nossos direitos humanos e o desrespeito à legislação internacional. As palavras arrogantes do porta-voz incitaram os colonos marroquinos nos nossos territórios ocupados e, durante vários dias, eles atacaram os bairros saarauís e torturaram famílias em plena luz do dia. Com o poema, eu quis transmitir força ao povo saarauí, expressar que somos um só, que estamos unidos e que vamos defender nosso direito de existir com a força da justiça, da razão e da dignidade”.

Eu sou o Saara
Salka Embarek

Serei guerra
e quando for necessário, serei paz.
Serei a paz da guerra
e o limite entre ambos
eu mesma marcarei.

Que não voltem a me chamar de fanfarrona,
Que nenhum ministro volte
a me provocar,
porque durante os anos da minha tragédia
já derrubei-lhes alguns muros
e consegui que caíssem seus falsos estandartes.

Não há governo usurpador
nem cruel
nem rei tão soberano
que possa me olhar nos olhos
e negar que seja culpado.
Não pode porque não se esquece das vezes que o enfrentei,
o expus e ganhei.

Olhe bem para mim,
porque o timão está em minhas mãos
e o vento sopra a meu favor,
não serei eu a que teme
não serei eu a que perde
nem ouvirás minhas palavras em vão.

Já sou velha,
passaram trinta e quatro anos
pisando em meu corpo
sob metros de terra enterrado.
Por mais de trinta anos deixaram
em minha boca sabores amargos,
alguns já não sinto,
outros viraram braços
de líderes desconhecidos
de mulheres com esperança
braços de mártires que voltam
crescendo na superfície
respondendo meu chamado,
o dessa velha que sou
e que agora volta jovem,
renovada.

Que não me chamem de fanfarrona,
porque meus filhos lhes responderão
que minha voz não anda só:
eu sou o Saara.

ESCUTE BEM O MEU NOME.

Redação da introdução e tradução do poema por Helena Zelic

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