Sou uma mulher da Palestina, onde espera-se que as vozes das mulheres sejam enterradas sob os escombros. Mas, apesar das diferentes formas de bloqueio, estou aqui hoje para fazer com que as vozes das mulheres palestinas – camponesas, revolucionárias, mártires e prisioneiras – sejam ouvidas.
Sou testemunha do crime que está acontecendo, de mulheres que perdem seus filhos sob bombardeios, de mulheres expulsas de suas casas, de uma geração inteira à qual é negado o direito de viver com dignidade. Vivenciamos um genocídio, a fome e o deslocamento forçado. No entanto, nós nos apegamos, cuidamos, protegemos e defendemos a nossa terra.
Na Palestina, as mulheres são os ícones da revolução, da ressurreição e do renascimento. São elas que protegem suas casas sitiadas e suas terras, sob ameaça da expropriação e do assentamento [de colonos promovido pela entidade sionista]. As mulheres são as guardiãs da memória coletiva. Elas não são meras vítimas, mas alvos que, quando atingidos, impactam as gerações futuras.
Estou diante de vocês hoje, em nome das mulheres do campo que constituem a espinha dorsal da soberania alimentar em todo o mundo. Ao mesmo tempo, elas estão entre as mais vulneráveis à marginalização e à exploração. As mulheres do campo cultivam suas terras, preservam as sementes, cuidam dos animais e assumem a responsabilidade de alimentar as nações. No entanto, a elas são negados os direitos fundamentais à terra, à água e às sementes, e são elas que sofrem violência patriarcal, social e econômica. Elas pagam o preço mais alto pela pobreza, pelo deslocamento forçado e pelos conflitos armados.
Na região árabe, o sofrimento das mulheres do campo é agravado por regimes políticos e econômicos subordinados a potências estrangeiras, limitados por acordos que colocam os interesses das grandes corporações acima dos interesses do povo. As mulheres do campo dos países árabes são privadas de recursos e ameaçadas pelas mudanças climáticas e pela seca. Elas enfrentam políticas agrárias neoliberais que as privam de seus direitos à terra, ao trabalho e a uma vida digna. Dito isso, elas continuam firmes, lutando para que a vida continue, para proteger a terra e defender o direito das pessoas à alimentação e à soberania.
A situação em meu país, a Palestina ocupada, é ainda mais dura. As mulheres do campo palestinas enfrentam a ocupação, os assentamentos e o confisco de terras, além da violência diária perpetrada pela máquina de guerra colonial sionista.
O genocídio que os palestinos enfrentam hoje revela o imperialismo cruel e a cumplicidade das potências coloniais e capitalistas globais. Até o momento, são mais de 73 mil mártires e pessoas desaparecidas, incluindo 19 mil crianças, e mais de 13 mil mulheres foram assassinadas pelos bombardeios, a fome e o cerco. As mulheres palestinas não perdem apenas casa e terra, mas também filhos e filhas. A elas, é negado o direito à vida. No entanto, elas continuam lutando pela terra, pela vida, por um futuro livre e digno.
Na Via Campesina, reafirmamos que nossa luta é global. Reconhecemos que nossa luta contra a ocupação sionista na Palestina é a mesma luta contra o capitalismo selvagem e as empresas multinacionais que roubam as sementes dos camponeses, destroem o meio ambiente e escravizam as pessoas.
Nossa luta contra o genocídio na Palestina é uma luta contra os regimes patriarcais, retrógrados e imperialistas que oprimem as mulheres em todos os lugares.
Minha mensagem para vocês e para todas as mulheres, jovens e homens do mundo que abraçam causas justas é: não deixem a Palestina sozinha. Nossa luta não é local. É a luta de todo ser humano que rejeita a injustiça. Somos inabaláveis e lutamos. Sonhamos com uma liberdade inquebrantável.
Juntos, devemos defender e proteger as mulheres do campo contra todas as formas de violência e exploração, garantindo seu direito à terra, às sementes e à água. Continuaremos a expressar a solidariedade global junto ao povo palestino, considerando sua luta como indivisível da luta do povo contra o imperialismo. Lutaremos contra o regime patriarcal e capitalista que marginaliza as mulheres, oprime o povo camponês e destrói o meio ambiente. Enfrentaremos as empresas monopolistas que roubam as sementes das pessoas camponesas, impondo uma agricultura industrial devastadora em detrimento da agricultura popular e da soberania alimentar. Por meio dessas ações, construiremos um movimento de luta global ancorado na solidariedade e em experiências e conhecimentos compartilhados, que coloca a soberania alimentar no centro da luta pela justiça social e pela libertação nacional e feminista.
Companheiras, nossa luta é pela vida diante das políticas de morte. A partir daqui, levantamos nossa voz: não há soberania alimentar sem uma Palestina livre, não há justiça social sem mulheres do campo livres, não há futuro para nosso povo sob o controle do imperialismo, do capitalismo e do atraso. Globalizar a luta, globalizar a esperança!

Samah Abunina integra a Via Campesina na Palestina. O texto é uma edição de seu discurso durante a Assembleia de Mulheres do 3º Fórum Global Nyéléni.
